lembro-me de quando ela chegou à nossa casa, trazendo nos modos o viço da juventude. Ao entrar, senti seu cheiro de fêmea se espalhando e entranhando nas paredes como fuligem. Sentou-se na sala, olhou os quadros na parede com a curiosidade típica da educadora. Minha mãe sentou-se à sua frente e as duas belas mulheres se olharam. Estavam alí, frente a frente duas vidas, duas lutas, dois amores, duas paixões e cada uma a seu modo.
Ela me viu meio escondido atrás do portal, com apenas um olho espreitando-a. O outro olho estava apertado, escondido na madeira pela timidez. Ela sorriu, mangando da minha infância e minha olhou na minha direção:
--- Saia daí, menino!
Eu fugi, pego com a mão na botija, espreitando, tomado pelos primeiros anseios da puberdade. Sai correndo, trôpego, embrenhei-me nos corredores e fui estar no meu quarto. tranquei a porta, subi na cama e fiquei olhando, através da janela, as mangas maduras e a passarada disputando-as num voraz banquete. As mangas em forma de coração, lisas, macias, doces.
O sorriso e o olhar feminino ficaram impregnados em minha retina. Eu sabia que a partir daquele dia, nossa casa nunca mais seria a mesma. Muitas coisas mudariam, umas para o bem e outras, para o mal.
Na cidade, as disputas continuavam, se acirravam, parecendo nunca terminar. Naquele mesmo dia, os Noronhas seguiram em silêncio carregando o caixão do filho caçula. Jogaram o caxão coberto de rendas brancas num buraco de sete palmos e jogaram terra marrom sobre ele. Os machos ficaram só olhando, enquanto as fêmeas gritavam aos céus pedindo por vingança.Tempos difícieis aqueles, como difícil sempre foi a vida, pois que nada nos é dado de graça.
Texto de Pedro Paulo de Oliveira.
Imagem: .forwallpaper.com
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