terça-feira, 30 de julho de 2013

POEIRA DO TEMPO



Almas que se arrastam por ruas e becos,
Levantando poeira, seguindo no tempo,
Trôpegas malabaristas bêbadas de vida,
Levam ossos eternos,
A carne que se esvai em flacidez implacável
E o tempo que não é tempo, que tempo não existe,
Fica estático esperando, sem pressa.

Do alto da igreja com o seu orgulho
Abre-se o Beco dos Defuntos,
Beco estreito por onde andam os vivos
Regado de lágrimas, coberto de pedras,
Ecoando lamúrias e medos,
Desenhando momentos, sentimentos...

Os avantesmas silentes flutuam indecisos
Se estão mortos ou vivos
E entram pelos adobes
Procurando seus amores perdidos,
Sussurrando paixões nos ouvidos,
Suplicas eternas, paixões petrificadas.

Vai a procissão levando os ossos,
Seguindo seu caminho permanente, renitente,
Segue levando volições findadas,
Construindo lápides por onde crescerão as heras
Esverdeadas sobre o lodo liso da vida que persiste.

Não há morte, morte que coisa nenhuma,
Os fantasmas teimam em ficar nas pedras,
Nas portas, nas paredes...
Fantasmas não dormem nunca,
Povoam os sonhos,
Vivem nos sonhos,
Poeira nos móveis,
Miríade de vidas,
Espectros.


Pedro Paulo de Oliveira
Direitos Autorais

Imagem:
Cássia Oliveira

sábado, 27 de julho de 2013

ALMA DESTERRADA



Quando choro, minhas lágrimas regam seu coração
petrificado pela dor e pelas lamúrias,
seu coração que grita constantemente por socorro
e você nunca ouve, na surdez do seu mundo
E mesmo distante, no rocio esvoaçante
vai meu pranto acalmar seu lamento
encher sua alma de paixão e delírio
e você sente minha presença tocando suas entranhas.

Do alto da pedra da fidelidade
Abraço sua anca invisível
olhando a imensidão encravada em meu ser
e jogo seu corpo que rola e não despedaça...
Desço correndo, pois que a vida não acaba,
Perco-me, para sempre, no meio do desconhecido.

Fecho os olhos, pois que a vida é nada, é instante então
e amar é padecer, essas lágrimas que se misturam ao orvalho
Desejo perene de prazer, solidão sempre ao dormir
sonhos no meio da escuridão, imagens misturadas, esvoaçantes,
perdidas, dilaceradas.


Poema: Pedro Paulo de Oliveira.
Direitos Autorais.

Foto: pxleys.com

terça-feira, 23 de julho de 2013

AS PEDRAS DO SANTUÁRIO.



O templo, o território, a grandesa, a majestade...
O santuário guardião dos desejos incontidos,
desejos perdidos, sem razão, sem perdão
entre as pedras repletas de confissões e excomunhões,
pedras seculares onde não vicejam musgos, nem lodo.

Nos olhos do homem sobre o altar
a imagem da mulher -que arde, pena em pecado
(sem medo e sem pudor)-está guardado os seus segredos
e os segredos dos outros.

os sinos anunciam o rito do encontro,
os sinos são os sinais do tempo e do momento
e a multidão sobe a avenida, pesarosa, esperançosa
e vai enchendo o templo - o coro canta -
e chega o padre que encanta.

A luz enche de cores a nave,
sobrevoam  andorinhas e imagens
e o ouro brilha nos trajes.

O pregador se levanta:
anuncia a salvação,
prega o perdão,
levanta a multidão
em contrita emoção.

Depois, todo mundo se ajoelha,
para se livrar das culpas
e reza - sem entender a oração de criança.

E Deus escuta e Deus olha,
entre as pedras do templo.
Ele sabe das volições,
ele entende as iniquidades,
Ele compreende que não há é pecado
no acasalamento apaixonado,
que pecado é maltratar a vida,
pecado e mentir para a vida.

"Este é o Meu Corpo e este é o Meu Sangue",
a multidão caminha em busca da ressurreição,
se arrasta com o peso do tempo que não para
diante da Cruz do martírio e da morte,
se ajoelha e espera a bênção
e lava a alma e alivia o corpo,
volta para casa e o coro canta,
o padre encanta,
guardião de segredos
filho de degredos.

As portas do templo se fecham,
Deus adormece... É a hora santa.
É a vez das corujas, é a hora dos morcegos,
momento dos fantasmas que não poem mais medo...
Os fiéis vão embora, vão pecar,
vão para as alcovas, vão fornicar,
Vão dobrar as ancas e sentir o encontro da carne
entre as coxas que se abrem para o gozo profundo.
Vão roubar, mentir e matar,
fugir e, no sétimo dia, descansar,
pois que Deus está em sono profundo
atrás das pesadas portas do santuário,
no frio das pedras que guardam a cobiça e a paixão.
Deus não pode mais escutar... está cansado
Ele não pode mais ver e nem sentir.


Pedro Paulo de Oliveira.

Direitos Autorais


Imagens:
Igrejas de São Francisco em São joão Del Rei
e do Pilar em Ouro Preto.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

NOITE, DESAMBIGUAÇÃO DOS DESEJOS.



Noite, tu és mulher voluptuosa,
mulher charmosa,
mulher dengosa,
mulher cheirosa.

Por que a noite sempre nos trás lembranças,
o gosto de alecrim e de alfazema?
Seria a noite o instante supremo da vida?
Ou seria a noite o momento mágico
quando desnudamos nosso eu
de convenções e proibições?

Noite, desambiguação de desejos contidos,
contidos pela luz do dia,
pela terra que gira na direção do sol.

Nós, humanos, somos seres notívagos,
ofuscados pela luz do dia
encontramos na noite
nosso eu suprimido.

Noite... de lua cheia, de via láctea
não apetece que chova
e que chova, mas não na minha alcova
onde meu corpo estremece de desejo
muito embora possa estar distante
dos meus olhos em danação.

A danação não me deixa ir embora
enquanto na noite eu não encontrar
seu corpo nu e sem demora
perder-me sem demora
que perdido na noite quero ficar
até que chegue, devagar, a aurora.


Somos filhos da noite, com certeza
de encontros ardentes e alucinados,
e da ânsia danada que viceja
de dois seres apaixonados.

É na noite que a (o) procuro
na penumbra tateio suas artes pudendas
despido (a) de opróbrio e de medo
sentindo o odor de barrela
atiçando ainda mais o meu fogo,
subindo a febre que toma meu corpo.

Venha, entregue-se, encontre-se na noite,
a noite é feita para os perdidos.



Pedro Paulo de Oliveira
Direitos Autorais

quarta-feira, 17 de julho de 2013

VIDA




O que busco?
A minha alma.
O que quero?
A vida.
O que olho?
O mundo,
A vida.
O que sinto?
A vida indo, indo e indo...
É bom?
Ah, é sim, é a vida!

Pedro Paulo de Oliveira.
Direitos autorais.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

O TURVO E O TEMPO



São muitas vidas, mil amores,
Ventos vindos do tapanhú
Muitas estradas, muitos morros,
Muita gente vinda do matutú.

No céu infinitamente azul,
Que brilha no rio sinuoso,
O voo eterno do urubu,
Gari negro e charmoso.

Igreja, igrejinhas, portas abertas pra rezar,
No dia que finda de luz dourada
De sossego na pracinha pra esperar
Deus, Virgem Maria e a pessoa amada.

O apito apita de longe e vem do trem...
Lembranças de um tempo distante,
Amores que foram e vêm,
No olhar da saudade presente.

Onde estão seus filhos barões?
O que foi feito dos seus sonhos de glória,
Dos escravos presos em grilhões
E das batalhas perdidas na memória?

Para onde foram as guerras
Do Coronel e do Visconde,
Orgulho sobre as terras,
Duelo eterno da fronde?

A resposta vem das pedras enterradas,
Dos gritos das conquistas ecoando,
Das vidas e das almas eternizadas,
Dos homens bravos lutando.

E resta, ainda, eterno, o casarão,
Dos muitos umbrais ungidos de dores,
Nos desenhos da grande embarcação,
Na avenida dos desejos e dos amores.

És tu, Turvo Grande, Turvo pequeno,
És tu que um dia viveu a glória,
Retiro de paz, recanto ameno,
Que levo, para sempre, na memória.


Pedro Paulo de Oliveira
Direitos Autorais.
Imagens: Cássia Aparecida de Oliveira




quinta-feira, 11 de julho de 2013

SEGUINDO EM FRENTE



A estrada, não importa,
Se de terra ou de ferro.
Sigo em frente,
Buscando meu eu.

Deixarei em cada estação
Um pouco dos meus sorrisos,
Meus passos cada vez mais cadenciados
E o calor das minhas mãos.

Por onde andei, fui menino e menina,
Fui homem e fui mulher.
Amei e fui amado
E continuei seguindo em frente

Seguindo em frente sempre,
Na serração da manhã,
No frio que segue a estrada
Sobre a terra, pedra e pedras,

Muitos passos e espaços,
Sob a chuva ou sob o sol,
Em olhares, beijos e abraços
e loucos desejos sob um lençol.

Levo comigo a minha casa,
Por onde entra o sol,
sol que vejo da janela,
Brilhando no arrebol.

Levanto sempre, não posso parar,
A serração dá espaço para a aurora
Ela se vai, diluindo-se no ar
Não há mais tempo, vou embora.

Pedro Paulo de Oliveira.
Direitos Autorais

domingo, 7 de julho de 2013

LUMES DO PASSADO.


O sol arde e queima o horizonte
Últimas faíscas de longo um dia
Do inverno impiedoso sobre o monte
E dos meus olhos que a tudo copia

Vejo o mundo, vejo os sonhos distantes
Na vida que com a luz se esvai
Deixando as lembranças dos instantes
Que só sabemos quando não temos mais

Não tenho mais o colo materno
Não tenho mais o amor perdido
Não tenho o sonho terno
Do menino concebido

Sou adulto andarilho errante
Suplicando um pouco mais de acalanto
Saudoso do passado distante
Deixado no espaço feito pranto.

Texto de Pedro Paulo de Oliveira
Direitos Autorais